Que mãos devem segurar o bebê?

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Frederick Leboyer

Uma palavra sobre as mãos que sustentam o bebê. É pelas mãos que falamos ao bebê, que nos comunicamos com ele.

O tato é a primeira linguagem, a que percebe a outra, de longe.

Ver e compreender vem após sentir. Com o uso da palavra e da inteligência.

É este tato que, nos cegos, reencontra a acuidade. Percebe-se logo como é importante o contato, a maneira de tocar a criança. É uma linguagem pele a pele. Desta pele da qual derivam os outros órgãos dos sentidos. Que são como janelas, que são como aberturas nas paredes de pele que nos limitam e separam do mundo. Aberturas através das quais entramos em relação com o “exterior”. A pele do recém-nascido tem uma inteligência, uma sensibilidade de que não suspeitamos. 

É por meio desta pele que a criança conhece o mundo: sua mãe. É por toda a extensão de suas costas que estava em contato com o útero. Era daí que recebia informações.

Quando dizemos que o passado está atrás de nós, não se trata apenas de uma imagem. É um fato. O passado está nas costas! Através dela o mundo, a mãe falava à criança.

Ora, quando a criança nasce, de repente, nada mais existe! O bebê está nu como Adão. E mãos o tocam! Mãos que não se parecem em nada com o útero. Não têm o mesmo calor, nem o mesmo peso, nem a mesma lentidão, nem a mesma força. Nem o mesmo ritmo.

Primeiro contato com o desconhecido, com o mundo, com o outro. Primeira surpresa, primeiro horror.

Porque estas mãos que tocam, que manipulam a criança, estas mãos ignorantes, desatenciosas, não têm nenhuma noção do que a criança conheceu até então.

As mãos são órgãos de inteligência, de vontade. Obedecem a músculos estriados. Músculos da consciência, da rapidez. Seus movimentos são vivos, breves, para não dizer bruscos. E aterrorizantes para o bebê, que conheceu apenas o movimento lento, contínuo das vísceras.

Como o infeliz bebê não ficaria em pânico com esse contato novo?

Como tocar, manipular um recém-nascido?

Muito simples: lembrando do que ele acaba de deixar. Tendo, uma vez mais, presente o seguinte princípio: tudo que é novo, desconhecido, aterroriza. Tudo que é reconhecível, tudo o que parece familiar, acalma.

De modo que, para acalmar, para pacificar a criança no universo estranho, incompreensível, onde é subitamente lançada, é necessário e suficiente que as mãos que a tocam falem uma linguagem “visceral”. Devem falar, tocar, como o útero o fazia.

Que significa isto?

Bem, simplesmente, as mãos devem retomar a lentidão, a continuidade do movimento de contração uterina, de “onda peristáltica”. Que durante meses a criança conheceu a ponto de “tê-la na pele”.

Eis porque, também, é preciso de inicio colocar o bebê de bruços a fim de poder, massageando-o, falar às sua costas.

Essas mãos devem dizer o que? O que a mãe, no útero, dizia. Não o útero do último momento, o útero do trabalho de parto, o útero furioso, que expulsava, que escorraçava. Mas o útero do início, dos dias felizes. O que estreitava lentamente, amorosamente. O útero que abraçava. O útero que era apenas amor.

Existia uma relação amorosa, infinitamente sensual, entre a mãe e a criança, entre o útero e sua presa.

É isto que precisamos reencontrar, dar à criança algo assim como um eco do que conheceu durante tanto tempo. Que perdeu subitamente e cuja ausência o angustia.

Não se trata de fricção nem de carícia. É uma massagem forte, apoiada, mas muito lenta. As mãos devem percorrer as costas do bebê, uma após a outra, sucedendo-se como ondas, como vagas, sem interrupções, interminavelmente. Antes da mão terminar seu trajeto, a outra deve começar. Vão, com um ritmo igual, até o fim do movimento. É um ritmo que deve ser redescoberto, re-aprendido.

Sem reencontrar essa lentidão visceral, esta lentidão que, instintivamente os amantes utilizam, é impossível se comunicar com a criança.

Mas… dirão todos, você está fazendo amor com essa criança!

Quase. Fazer amor é retornar ao paraíso, é mergulhar no mundo de antes do nascimento, de antes da grande separação. É reencontrar a lentidão primordial, o ritmo cego e todo-poderoso do mundo visceral, do grande oceano. Fazer amor é a grande regressão.

Aqui é o contrário. Trata-se de ir adiante. De facilitar a passagem, tornando-a aceitável, agradável, deliciosa, e não terrificante, repulsiva.

O que fazemos aqui é acalmar a angústia de um expatriamento total, prolongando um estado no novo estado. É acompanhar a criança. É acalmá-la fazendo correr ainda sobre suas costas a sombra da onda uterina que conheceu e terminou por amar durante tanto tempo.

De resto, será preciso renovar essa massagem lenta e sábia seguidamente. Sim, fazer amor é o remédio soberano para a angústia, é reencontrar a paz e a harmonia. No desastre que é o nascimento, não é justo usar esse soberano modo de encontrar a paz?

Mas as mãos também podem ficar simplesmente imóveis. Através das mãos que o tocam, o bebê sente tudo: nervosismo ou calma, falta de jeito ou segurança, ternura ou violência. Ele sabe se as mãos o amam. Ou se são distraídas. Ou pior, se não querem saber dele. Entre mãos atentas, amorosas, a criança se abandona, se abre. Entre mãos hostis, rudes, ela se retrai, bloqueia-se, fecha-se.

De sorte que antes de se movimentar para seguir as vagas que percorrem o pequeno corpo, é suficiente deixar as mãos imóveis sobre a criança. Mãos que não sejam inertes, distraídas, ausentes, mãos que não estejam longe. Mãos atentas, vivas, vigilantes, que sintam o menor movimento da criança. Mãos leves. Que comandam. Que não pedem. Que simplesmente estão lá, seguras.

Mãos leves, mas pesadas com sua carga de ternura. E de silêncio.

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