Bioenergética ? Um Panorama atual

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Odila Weigand

Resumo

Momentos de transição propiciam novas aberturas. No momento que Alexander Lowen se aposenta da direção do Instituto Internacional de Análise Bioenergética, é oportuno discutir alguns aspectos da teoria e da prática clínica que refletiu por 45 anos a personalidade do seu criador. Três aspectos do processo terapêutico são aqui abordados, à luz da Teoria do Conflito e da Teoria da Falta: Construção de Estrutura, Dissolução de Resistências Caracterológicas e Resolução de Conflitos.

Introdução

Escolhi falar do Panorama Atual da Bioenergética porque Alexander Lowen e a Análise Bioenergética tem sido como que indissociáveis na mente das pessoas. Como alguns de vocês já sabem, Alexander Lowen se retirou em 1996 da direção do Instituto Internacional e a Análise Bioenergética continua seu caminho, não sem ele, porque está vivo e continua praticando a psicoterapia. Mas já não está mais à testa da instituição, delineando caminhos para a teoria e a prática da psicoterapia.

Isto é um fato histórico. A Bioenergética está num momento de transição. Com a saída de Lowen da direção da Instituição, depois de 40 anos, quem foi escolhido pelos membros do Instituto para dirigir o Instituto? Uma mulher, que mora na California, e se chama Virgínia Wink Hilton. Como dizia Reich, as coisas acontecem num movimento de Tese e Antítese para chegar a uma Síntese. Se assim for, estamos no movimento da Antítese, e espero que, conscientes disso, vamos saber evitar os extremos. Mas é significativo que depois de seguir um pai por tantos anos, tenhamos buscado uma mãe.

Lowen tem sido uma personalidade forte e autoritária, e essa marca se imprimiu em sua instituição, conduzida sob a égide patriarcal. Ele porém desenvolveu a qualidade rara, própria de quem adquiriu sabedoria, de se olhar à luz de seus próprios conhecimentos. E foi capaz de ver a estrutura hierárquica narcísica que usualmente se forma em qualquer instituição, sobretudo quando existe um líder carismático.

É curioso como a história se repete, mas, com um bom grounding, vemos como é possível chegar a um final diferente. O próprio Lowen em entrevista a Ron Robbins conta uma passagem de sua relação com Reich e a estrutura hierárquica que se formara em torno de Reich. Foi quando Lowen voltou da Suiça, terminado o curso de medicina, e queria começar a praticar nos Estados Unidos. O ano era 1951. Diz ele:

“Reich estava no topo da estrutura, como um Deus. Os terapeutas reichianos, na estrutura, eram como anjos e arcanjos. Aqueles que acreditavam em Reich e na terapia seriam salvos e o resto do mundo seria amaldiçoado. Era como eu o via. Se de fato era assim ou não, era como eu o via”. … “Os seguidores de Reich tinham desenvolvido uma devoção quase fanática por ele e seu trabalho. Era considerado presunçoso, se não herético, questionar qualquer de suas declarações ou modificar seus conceitos à luz da experiência própria de alguém.” Lowen via seus colegas como “muito dogmáticos”. “Eles simplesmente citavam declarações de Reich, ninguém oferecia qualquer compreensão independente e quando eu o fiz, foi rejeitada.”

Mais de 30 anos depois, Lowen se encontra numa posição semelhante à ocupada por Reich. Ele também foi muito citado e alguns seguidores tiveram tendência a dogmatizar alguns conceitos. Teorias são boas enquanto não se tornam doutrinas.

Finalmente, após vários anos de preparação para essa transição, Lowen decide se aposentar, o que nos possibilita examinar sua obra com um certo distanciamento. Fica livre o caminho também para a abertura para outras áreas do conhecimento, para o surgimento de formas novas e criativas de utilizarmos suas descobertas.

Quem já não leu alguma coisa de Lowen, seja concordando ou mesmo discordando? Ele criou teorias, abordagens inovadoras para trabalhar o corpo, ensinou e formou centenas de terapeutas que trabalham na Europa, Estados Unidos, Canadá, América do Sul, Israel. Sua Escola, como entidade formadora de profissionais, tem mais de 40 anos. Teve contato e exerceu influência em muitos terapeutas que se tornaram por sua vez criadores de outras escolas. De sua associação com John Pierrakos, nasceram os princípios básicos da Análise Bioenergética. Depois John Pierrakos seguiu seu próprio caminho pesquisando a aura e os chakras. Pierrakos também criou sua escola, em que combina os princípios da Bioenergética, Análise do Caráter, Análise da Resistência, com uma abordagem espiritual que ele assimilou de sua esposa Eva.

Contribuições de Lowen

O que todos eles guardaram do que aprenderam com Lowen? Eu diria que o principal elemento, é o GROUNDING. O mérito da descoberta de Lowen e Pierrakos foi compreender que, diferente do procedimento de Reich de desbloquear anéis começando pelo ocular e terminando pelo pélvico, deveriam começar a desbloquear as pernas para que pudessem receber toda a energia de cima que se liberava e logo, gradualmente, subir através de cada segmento. Liberar as pernas para o fluxo energético não é igual a desbloquear a couraça pélvica. Ao liberar as pernas, estamos fortalecendo o ego.

Grounding é enraizar-se no planeta, contato com a realidade que nos torna a todos humanos, semelhantes, emocionais, capazes de amar e sentir dor, compaixão, alegria, prazer. É a realidade dos sentimentos, vivida no nosso corpo vivo e vibrante, não apenas como experiências mentais. Lowen nos legou a compreensão de que é possível desenvolver no corpo, através de exercícios, a capacidade de vibrar e com isso ir dissolvendo rigidez ao mesmo tempo que criando condições para o tecido tolerar uma maior carga energética. Ao tolerar mais carga energética em movimento, nos tornamos capazes de sentir nossas emoções

Tendências

Quais seriam então as tendências que constituem o Panorama Atual da Análise Bioenergética?

– Avaliação crítica dos conceitos teóricos e da prática clínica, buscando discriminar o que é realmente útil para aquele cliente em particular . Separar o joio do trigo. Desmitificar a teoria, separá-la do mito-pessoa.
– Desenvolver pesquisas para validar a eficácia das diferentes intervenções psicoterápicas
– Construção de estrutura, dissolução de resistências caracterológicas e resolução de conflitos. O que nos remete a uma prática que integra as Teorias do Conflito e da Falta (falta das experiências essenciais que constituem um ego saudável). Este vai ser o tema desta palestra.
– Busca de abordagens adequadas para o tratamento de pacientes borderline, tanto da estrutura de caráter borderline quanto dos estados de perda de limites que aparecem em estruturas rígidas quando se desmancham couraças e se perdem referenciais externos organizadores do senso de identidade.
– Multidisciplinaridade e deselitização da terapia (este tema vai ser abordado pela minha colega Laine Pizzi, em sua apresentação).

Eu espero que ao final desta fala alguma coisa seja esclarecida, ou, caso contrário, suscite perguntas que eu possa responder aqui ou depois se forem mais específicas. Deixo este convite a quem estiver interessado, que me procure depois, ou escreva, ou telefone, ou mande um e-mail.

Desmitificar

Vamos falar um pouco do mito. De todos os livros de Lowen, que abordaram métodos terapêuticos para diferentes tipos de caráter, eu pessoalmente acho que o mais importante é o livro Narcisismo – Negação do Verdadeiro Self. Acho que é também o mais auto biográfico. Ali o autor aprofundou-se em si mesmo, expôs uma dinâmica muito útil para compreendermos muita coisa da neurose que permeia nossa cultura. E exatamente por estar tão em contato com a verdade, ele também não ficou imune ao mal que acomete quem descobre uma parcela da verdade: GENERALIZAR. Estas generalizações criaram algumas confusões teóricas, com reflexos na prática, como veremos mais adiante. Muitos terapeutas menos avisados por vezes praticam a bioenergética duma forma que pode ser “demais” para alguns pacientes. Outros terapeutas se deram conta de que por vezes se criava uma falta de sintonia com o paciente, e se afastaram. Outros ainda, permaneceram e desenvolveram seu trabalho dentro da linha da Análise Bioenergética, buscando descobrir aquilo que ela tem de realmente útil para aquele cliente específico, e integrar a compreensão da personalidade mais as técnicas bioenergéticas, com os conhecimentos advindos de outras correntes da psicologia. Buscando outras fontes de conhecimento que complementem nossa visão.

Vamos falar agora daquilo que aparentemente é uma controvérsia, a Teoria do Conflito baseada na Teoria das Pulsões de Freud e a Teoria da Falta, baseada em Melanie Klein e seus seguidores.

Função do Orgasmo e Potência Orgástica

Mas antes de prosseguir no nosso tema: Construção de Estrutura, Dissolução de Resistências Caracterológicas e Resolução de Conflitos, gostaria de retomar os conceitos de Função do Orgasmo e Potência Orgástica.

Ao me perguntar se a Função do Orgasmo ainda é um modelo válido de crescimento, a resposta a que cheguei foi SIM. Na medida em que a considerarmos como uma fórmula da auto regulaçào. A Função do Orgasmo, longe de ser um tema esgotado, nos abre possibilidades de explorarmos diferentes experiências orgásticas: onde quer que haja fusão, expansão, sexualidade, amor, prazer, nutrição emocional, podemos chamar de experiência orgástica, ainda que não haja uma expressão através do contato genital. Assim, se pensarmos em Reich, eu diria que sua descoberta da Função do Orgasmo como modelo da Auto Regulação da própria Vida, foi um acerto. No entanto as inferências quanto à potência orgástica são de utilidade limitada, na minha opinião, quando pensamos em tratar os males mais comuns e freqüentes das pessoas que nos procuram.

No entanto acredito que o conceito de Potência Orgástica como medida da saúde física e mental influenciou durante muitos anos o desenvolvimento da teoria e da prática da Análise Bioenergética. Foi recentemente, em 1992, que Lowen abriu mão oficialmente deste conceito e colocou que o objetivo da terapia bioenergética passava a ser, para ele, auto percepção, auto expressão e auto possessão, ou seja, conhecer-se, expressar sua verdade e ser dono de si mesmo. Passou a colocar o ego saudável como o objetivo principal da terapia, e a manifestação da sexualidade como uma das formas de expressão desse ego saudável.

O Caminho de Lowen

Vamos lembrar um pouco mais da história pessoal de Lowen, para nos ajudar a entender o seu caminho e a evolução da Análise Bioenergética ao longo destes 45 anos.

Conforme o descreve Ron Robbins em seu livro O Tao da Transformação, Lowen é um Realizador, que é a característica dos caráteres rígidos.

Formou-se em direito, mas era a época da depressão econômica nos Estados Unidos – 1934, não havia trabalho; ele continuou os estudos e recebeu o título de doutor em jurisprudência, magna cum laude. Como era difícil arrumar trabalho, ele trabalhou como orientador de atletismo num acampamento de verão. Ali ele aprendeu que a atividade física melhorava a saúde mental. Fascinado porque havia constatado o fato mas lhe faltava uma teoria, continuou buscando saber mais até que assistiu uma palestra de Wilhelm Reich em 1940, um anos depois da chegada de Reich aos Estados Unidos. Vou citar Ron Robbins “Freqüentando as aulas de Reich, Lowen identificou-se com ele, tornando-se seu aluno com o objetivo de tornar-se terapeuta reichiano. Identificou-se fortemente com o Reich carismático.” Vamos relembrar um exemplo curioso do manejo da transferência por Reich, que valorizou o aspecto positivo do traço de caráter de Lowen. Quem nos conta é o próprio Lowen. Um dia Reich lhe disse “se você está realmente interessado nesse trabalho, só há uma forma, é submetendo-se à terapia“. Lowen não achava que precisasse de terapia, considerava-se bem sucedido dentro dos limites da época e livre de conflitos. Ele foi sincero com Reich: “Eu estou interessado, mas o que eu quero é tornar-me famoso“. Reich levou a sério e respondeu “Eu farei você famoso“. Isto soa grandioso? Narcisista? Bem, vamos continuar ouvindo Lowen: “Passados os anos eu considerei a declaração de Reich como uma profecia. Era o empurrão de que eu precisava para transpor minha resistência e lançar- me ao trabalho de minha vida“.

A Teoria do Conflito e a Teoria da Falta

A Dissolução de Resistências

Foram anos e anos a trabalhar com pessoas, dar palestras e demonstrações, acrescentar descobertas próprias e aquelas que vieram de outros como Fritz Perls. Lowen utiliza métodos da Gestalt e Perls fez terapia com Lowen por um tempo, sendo influenciado por ele. Ao lado da elaboração das técnicas corporais, a linha mestra da teoria da bioenergética vai se desenvolvendo com base na psicanálise freudiana que adotava a Teoria das Pulsões como referencial. Durante muitos anos Lowen acreditou e ensinou que “questões infantis (da fase pré edipiana) não podem ser resolvidas até que o conflito edipiano seja plenamente elaborado, compreendido e trabalhado“. Isto significa que questões sexuais são a primeira preocupação do terapeuta. Todos os problemas e dificuldades que o cliente apresenta são analisados como defesas e resistências contra a sexualidade.

Com essa posição, colocava o foco do trabalho na Dissolução de Resistências. 

É bastante conhecida a idéia de que cada terapeuta se inclina para uma teoria, em geral motivado pelo seu próprio estilo de caráter. Reich é associado com os rígidos, mas também com o caráter impulsivo, que aliás foi o tema do seu primeiro texto. Lowen é associado com o caráter rígido e com a estrutura do fálico narcisista, tanto que seu livro sobre o Narcisismo, acrescenta uma profunda contribuição para a nossa compreensão analítica . A questão básica do rígido é a fase edípica, com sua constelação de relação triangular, rivalidade, ciúme, medo de castração. A base para a compreensão desta etapa do desenvolvimento infantil é a teoria da pulsão de Freud e a idéia do conflito está sempre presente. Foi um caminho natural para Lowen adotar essa corrente. Lowen, diferentemente de outros teóricos da psicanálise como Otto Kernberg, diz que o narcisismo tem origem na fase edípica como consequência de uma postura sedutora do genitor do sexo oposto, que faz crer à criança que ela é ‘especial’. A fim de fazer jus a essa imagem de especial, a criança acaba desistindo do seu verdadeiro Self e criando um Falso Self para atender às necessidades narcísicas do genitor amado. Dessa orientação de Lowen, baseada na teoria das pulsões e priorizando o trabalho com a fase edipiana, surgiu uma corrente teórica e um modelo de prática clínica que norteou a prática de muitos terapeutas por muitos anos. Nós sabemos hoje que o édipo é uma posição de conflito, rivalidade e sobretudo uma posição perdedora. Acredito que foi aqui que ocorreu uma generalização: Lowen desvendou com profunda acuidade a dinâmica dos caráteres rígidos e generalizou ao ensinar que outros caráteres deveriam ser tratados de forma similar. (Texto Ego, Caráter e Sexualidade de 1987, época em que estava defendendo o que chamou de movimento De Volta às Origens).

Acho que o movimento De Volta às Origens que Lowen propôs em 1987 (onde reafirmava a Teoria do Conflito como a verdadeira base teórica da Análise Bioenergética), foi um extremo de um movimento pendular, tentando defender a pureza dos princípios reichianos, pureza que parecia ameaçada pela introdução de novos conceitos que demandavam uma revisão em conceitos que haviam se tornado quase dogmáticos como a marcante priorização do trabalho com o édipo. Mas como tudo na vida, o pêndulo retorna.

A Construção de Estrutura

A Teoria do Conflito (originária da Teoria das Pulsões de Freud), que foi adotada por Reich e por Lowen, diz que os problemas nascem de conflitos entre desejo e repressão. Isto é verdadeiro para as organizações que alcançaram a fase edípica relativamente bem estruturadas e nesse momento, dos 3 ½ aos 5 anos, cristalizaram suas defesas de caráter em torno da constelação de conflitos edipianos (relação triangular, ciúme, rivalidade, desejo pelo genitor do sexo oposto). O que dizer dos outros, que sofreram faltas dos cuidados na fase adequada, falta do contato, falta dos estímulos essenciais necessários para chegar ao édipo relativamente intactos e cujo egos não tiveram a chance de se desenvolver plenamente em harmonia com a força dos impulsos? O Ego infantil precisa receber experiências que constroem uma estrutura capaz de lidar com a força dos impulsos. Essas faltas ou falhas no desenvolvimento estão subjacentes às defesas de caráter como nós as conhecemos. Uma defesa de caráter se forma para encobrir uma falta, uma ferida, e nos serve para compensar essa falta para não sentirmos a dor e continuarmos vivendo. E muitas vezes as faltas têm que ser atendidas ANTES de se mexer com qualquer defesa, antes de se tentar desmanchar defesas. Na prática, significa que uma pessoa com um ego relativamente frágil, que a nível corporal tem dificuldade para conter, canalizar e direcionar a energia na vida atual, embora essa pessoa traga para a terapia material com conteúdo sexual, não poderá ser ajudada se lidarmos diretamente com esses conteúdos que possuem potencial desestruturante devido à poderosa carga sexual, que ameaça a frágil estrutura do ego.

Ao mesmo tempo que a bioenergética prosseguia se apoiando na Teoria do Conflito, cresciam nos Estados Unidos as escolas psicanalíticas que seguiam Melanie Klein, pesquisando o tratamento da problemática pré genital. Essas escolas tomaram o nome de Psicologia do Ego e Psicologia do Self nos Estados Unidos, Heinz Kohut, Otto Kernberg, Alice Miller. Na Europa, Winnicott e em seguida Daniel Stern divulgam seu trabalho, que faz parte da Teoria das Relações Objetais. Acontece também que as pesquisas voltadas para o comportamento de famílias e crianças saudáveis começaram a ser amplamente divulgadas a partir de 1970, com o trabalho principalmente de Margareth Mahler. Só em 1975 sai o seu livro O Nascimento Psicológico do Bebê Humano que abriu as portas para estudar a Saúde – aquilo que contribui, numa criança normal, para a constituição de um ego saudável. Passaram. Popularizou-se o conceito de Desenvolvimento Interrompido, ou seja, diante de uma situação traumática ou da FALTA da experiência que constitui o Ego na fase adequada, ficaria como um ‘buraco’ na personalidade, onde faltou a experiência essencial. Esse ‘buraco’ vai constituir a Ferida Narcísica. Por exemplo, se uma mãe tem depressão pós parto e crises de pânico, não querendo nem mesmo ver seu bebê porque não pode tolerar as demandas orais da criança, essa criança vai crescer e se desenvolver, compensando esse buraco, essa ferida narcísica, talvez com uma atitude rígida – “eu não preciso de ninguém”.A teapia deverá ser diferente da criança cuja mãe esteve presente, amamentou, e que encontrou sua primeira grande rejeição por volta dos 5 anos de idade com o advento da sexualidade edípica. Esta última também poderá apresentar na superfície a defesa rígida “eu não preciso de ninguém”, mas a história e o tratamento são diferentes.

Ora, observamos que quanto mais bem sucedida uma idéia ou uma praxis, mais difícil fica dela ser modificada. Demorou para que as pessoas que se formaram em torno das idéias do modelo do conflito, e que se davam bastante bem com esse modelo, aceitassem as novidades. Que novidade era essa? Nada de tão novo assim. Significava integrar a visão de Melanie Klein à visão freudiana. De uma maneira bem simples, o que isso significa? Significa que o modelo do conflito, que lida basicamente com os conflitos da fase edipiana, não dava conta de ajudar pessoas que vinham com traumas de fases mais precoces, com feridas narcísicas instaladas na fase pré-natal, no nascimento, ou nos primeiros dias e meses de vida. Pelo contrário, elas pioravam quando tratadas da mesma forma que pessoas cujo trauma se situava na fase edipiana.

Em 1992, a consciência da relação entre essa controvérsia e a questão da Potência Orgástica, fez com que o tema mais explorado na Conferencia Internacional em Miami fosse a atualidade da proposição de Reich sobre Potência Orgástica. Em 1992 Lowen modifica sua posição.

Ele vem a público na Conferência Internacional em Miami , reconhecendo que falhou em certos aspectos e foi arrogante. Como o próprio Lowen sempre pregou, o reconhecimento da nossa fragilidade e do nosso fracasso é o que garante a verdadeira força e a sobrevivência . Ele foi capaz de fazer esse movimento pendular, pendendo num momento para uma posição mais autoritária e rígida quando em 1987 lançou um movimento que chamou “Back to Basics” ou De Volta às Origens – e depois voltou a abrandar a rigidez, possibilitando uma revisão e uma correção de rumo, a partir de 1992. Acredito que esta capacidade de rever, de ir de um extremo ao outro de um movimento pendular, para chegar a uma síntese, seja a grande qualidade que garante a força e a sobrevivência da sua escola.

A aparente controvérsia gerada pelo tempo que se levou para reconhecer e incorporar à prática da Análise Bioenergética as teorias das Relações Objetais e Psicologia do Ego, foi mais um descompasso no tempo. Principalmente os terapeutas da Califórnia adotaram primeiro essas teorias, e foram adaptando sua prática a elas, enquanto alguns terapeutas de Nova York levaram mais tempo.

A síntese destas duas teorias levou a uma mudança de paradigma. Aquilo que era visto como patologia ou atitude de caráter a ser desmascarada e desmanchada, passou a ser reconhecido como uma expressão distorcida das necessidades genuínas de contato, segurança básica, amor, espelhamento, reconhecimento. A partir da aceitação de um novo modelo teórico, derivam uma compreensão energética e intervenções corporais condizentes. A compreensão do papel do terapeuta na transferência, bem como a contra transferência, se adaptam. Aliás, como dizia Winnicott, a mãe suficientemente boa se ADAPTA às necessidades da criança. 

Aquilo que parecem ser duas correntes, na verdade são complementares e acabam se fundindo num único movimento de onda que constitui o movimento da terapia .

Na verdade, o terapeuta deve desempenhar as duas funções durante o tratamento: ser receptivo (ressonância, holding) e desafiar (excitar, confrontar).

Resolução de Conflitos

Dentro da proposta de multidisciplinaridade, existe abertura para buscar em outras abordagens psicoterápicas os elementos que complementam a Análise Bioenergética. Por exemplo, para resolução de conflitos, além de trabalhar a problemática pessoal, podemos utilizar conceitos e práticas da Terapia Sistêmica, Terapia de Casais e Família. 

E Agora?

As teorias nascem da observação dos fatos. Ora os fatos observáveis para Reich e Lowen eram as pessoas que eles atendiam, que eram produto de uma sociedade predominantemente repressiva. Acontece que a partir da década de 70, quando as barreiras sociais quanto a sexo e autoridade caíram, muita coisa mudou. As pessoas se tornaram outras. As novas gerações já não se criaram restritas às influências do círculo familiar. Crianças são expostas ao mundo, pela TV, pela escola, desde muito cedo. A geração das drogas deixou sua marca, mesmo nos não usuários. Quem de nós não aprecia músicas compostas e interpretadas por pessoas sob influência de drogas? Elis Regina, os Beattles.

Este fim de século se caracteriza pela evolução filogenética seguindo seu ritmo lento, ritmo esse violentado pela velocidade vertiginosa das mudanças culturais e sócio econômicas. Esses organismos estressados pela violência que lhes é imposta de fora para dentro, necessitam mais construir seus egos do que ter seus mecanismos de defesa desmontados.

As defesas mudaram de lugar, tornaram-se mais primitivas. Do músculo migraram para o campo energético. Isto é ruim? Já começo a acreditar no que apenas pressentia – faz parte da evolução da espécie, parece inevitável que as pessoas hoje em dia operem mais com o campo energético.

O aumento da problemática borderline, ao invés de ser vista como uma calamidade, pode ser considerada uma consequência da necessidade de conviver com a inconstância dos nossos objetos. Piaget mostrou como a constância do objeto é essencial para a formação de um ego. Eu arriscaria dizer que um pouco borderline nós todos precisamos ser para absorver as mudanças que estão ocorrendo no mundo – diluir nossos limites facilita mudarmos de forma. Nossos limites se diluem quando perdemos referenciais externos e internos que organizavam nosso senso de identidade. Amanhã vou abordar alguns aspectos energéticos do processo de mudança, falando de Vazamento de Energia.

Quanto mais se lida com as energias sutis, em vez de negar que elas existem, mais precisamos de grounding e mais vamos ter a percepção do contato cósmico. É inevitável que as pessoas, ao se sentirem inseguras, se defendam também com o campo energético, que é uma defesa primitiva e tem a ver com bloqueio ocular. Alguns se destroem, outros enlouquecem, mas aqueles que sobrevivem podem dar uma imensa contribuição à humanidade. E mesmo os que não sobrevivem como Lady Di… dão sua contribuição. Podemos ver este momento como um importante momento evolutivo.

Quem viu o filme Gênio Indomável, com Robin Williams no papel de um terapeuta que trata de um jovem que possui um gênio extraordinário para resolver problemas matemáticos, mas estava para ser encarcerado por brigas e violações da lei.? Esse filme foi lançado em Fevereiro de 1998 e logo alcançou grande sucesso. O rapaz vai literalmente derrubando vários terapeutas com suas perguntas invasivas e sua agressividade verbal. A diferença entre Robin Williams e os outros terapeutas é que ele não tenta se esconder atrás de uma imagem narcísica. Ele se expõe e se deixa tocar e modificar pelo cliente . Aí vão acontecendo, na transferência, as experiências essenciais que faltaram na história do jovem: confiança, respeito, aceitação de limites, para por fim haver identificação positiva e busca da afeição do homem mais velho. Como resultado, ocorre um fortalecimento do ego, reconhecimento do valor próprio, e o desejo de estabelecer vínculo afetivo com uma mulher. Antes ele fazia sexo mas não criava vínculo.

O que surge então no Panorama da Bioenergética?

Em 1990 Lowen publica Espiritualidade do Corpo. Após alcançar um extremo da polaridade, radicalizando a postura de que todos os problemas eram defesas contra a sexualidade, ele pôde seguir adiante em sua exploração e introduzir na terapia o outro polo desse eixo, a espiritualidade. Isto significa reconhecer e abrir o estudo das energias sutis, já não mais vistas como apenas patologia esquizoide. Vejo que Lowen esteve sempre cumprindo sua missão: dar grounding e dar um corpo a conceitos e práticas psicoterapêuticas. Escreve ele em 1990: “o ser humano é uma criatura sexualmente diferenciada em todas as células do seu corpo. …Da mesma forma, a espiritualidade é uma função do corpo todo. A espiritualidade, dissociada da sexualidade, transforma-se numa abstração, e a sexualidade dissociada da espiritualidade passa a ser um ato puramente físico. Essa dissociação é causada pelo isolamento do coração, o que desfaz a conexão entre as duas extremidades do corpo.

A questão de estarmos nos desenvolvendo e nos tornando mais sensíveis aos campos energéticos nos leva a olhar para o outro polo energético, o polo oposto ao polo sexual – nosso contato com a energia cósmica, nosso sentido de espiritualidade. E para seguirmos em frente com segurança nessa busca do contato unificante, que é a etapa evolutiva atual que a humanidade enfrenta, precisaremos cada vez mais de estar em grounding, centrados, fluindo, pulsando, reconhecendo e expressando os sentimentos de amor a partir de um coração aberto e manifestando nossa verdade pessoal. Todos estes grandes acertos que o Dr. Lowen teve como missão organizar de forma acessível e divulgar, criando métodos para que as pessoas pudessem desenvolver essas habilidades.

Encerrando, gostaria de deixá-los com o pensamento que o único milagre que regularmente acontece é a criação de uma nova vida. Com esta nova vida estamos nos preparando para o desafio do futuro. Acredito que o amor é o que cura, enquanto vivemos a excitação da criação e da descoberta.

Este texto foi apresentado no Encontro Paranaense de Terapias Corporais e foi publicado na Revista Reichiana no. 8, 1999)

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